Marvin
estava encostado na grade há um bom tempo. Várias pessoas também estavam
encostadas a sua volta, mas ninguém prestava atenção nele. Todos estavam
olhando para dentro da pista de skate onde um cara parecia saber voar. Ele
subia e descia. Ia dando grind nas bordas da piscina vazia. Todas as meninas
queriam dar pra ele e, alguns meninos também.
Por
várias vezes parecia que ele ia cair de costas no chão, mas era só mais uma
manobra. De lá de longe veio chegando como quem não quer nada um cara alto que
andava um pouco curvado por aí. Ele fumava um cigarro e chutava pedrinhas
enquanto andava.
-oi Marvin- ele disse como se
estivesse morrendo
-e aí Luiz. Faz muito tempo que
não te vejo. Sei lá uns 6 meses
-pois é
-ainda tá escrevendo alguma
coisa?
-parei.
-como assim Luiz?
-O que eu escrevia parou de fazer
sentido pra mim
-é uma pena, parar de fazer sentido é a pior coisa
que já me aconteceu.
Luiz
ficou um tempo olhando o skatista e, então, ofereceu um cigarro para Marvin.
Ficaram fumando em silêncio até que o skatista saiu de dentro da piscina vazia
e colocou seu skate de lado.
-o que ele tem que nós não temos?
-habilidade...
-além disso?
-sei lá
Um
monte de gente estava em volta do skatista conversando com ele. Marvin e Luiz
continuaram encostados na grade fumando um cigarro. Por fim, Marvin quebrou o
silêncio.
-um monte de coisa parou de fazer
sentido ultimamente.
-quando eu era mais novo eu
andava de skate
-tipo, eu entendo que o sol nasce
todo dia.
-mas eu era muito ruim
-mas não entendo por que o resto,
tudo, acontece assim manja?
-foda... Mas eu tinha medo de
quebrar o braço
-tipo quando você acorda com medo
no meio da noite. Eu acordo tremendo e me cubro com o lençol até cair no sono.
-minha prima andava de skate
melhor que eu
-aí quando eu acordo de manhã eu
acabo me lembrando que acordei com medo ontem e penso “caralho Marvin, tu é
muito escroto”
-se eu tivesse dinheiro ia
aprender a andar de skate hoje em dia
-mas nada disso importa porque a
noite eu acordo de novo morrendo de medo. E eu nem tava sonhando com nada. Só
acordo com medo e tremendo que nem um cachorro de madame.
-foda... Mas custa caro demais
-tipo, ontem eu acordei com medo,
mas voltei a dormir só pra ter um sonho bizarro em seguida. Cara meu sonho foi mais ou menos assim. Era como
se eu tivesse num videogame, um videogame muito ruim. Eu tinha uma arma, tipo
um revólver preto, que eu mirava nas pessoas. Eu tava tentando levar outros
dois caras, ou um cara e uma mina, não me lembro, pra um ponto específico do prédio. E essas
pessoas continuavam vindo atrás de mim pra me matar. Eu mirava elas com meu
revólver preto e atirava. Atirava várias vezes. E elas nunca levavam tiro.
Simplesmente desapareciam depois que dava 6 ou 7 tiros nelas. Minha vó, quando
me ensinou a atirar, empunhava uma pistola azul de brinquedo que eu tinha. Ela
falou algo como “se você pegar assim, com uma mão cobrindo a outra, e apontar
acima do alvo e descer um pouco até ter na mira o que você quer acertar. Bum.
Você nunca erra”. Eu fazia exatamente como minha vó mandou, mas mesmo, assim
errava aquelas pessoas. Depois de um tempo eu encostei as pessoas que tava
escoltando numa parede e os mandei ficar relaxando um pouco por que tava
cansado. Nesse momento mais dois inimigos vieram, um cara e uma mina. Eles não
me viram a principio então eu fiquei parado. Cada um tinha uma espingarda muito
bizarra parecia de brinquedo. Aí o cara colocou a dele de lado e resolveu tirar
a blusa. Ficar sem camisa no meio duma porra duma guerra. Aí a mina ficou se
esfregando nele. Eu fui, rastejando, até a espingarda e peguei-a. Engatilhei e
voltei rastejando até o cara. Mirei no cu dele. Sério, mirei bem no cu dele. E
atirei. Por um momento achei que a arma não ia funcionar já que ela parecia uma arma de brinquedo. Mas
funcionou. Saiu sangue por todo lado. E
o cara caiu em cima de mim. A mina ficou gritando alguma coisa em russo ou
ucraniano ou bósnio sei lá. Eu me levantei e coloquei a espingarda no peito
dela e atirei. Bum. Mas ela não caiu.
Então ela tirou a blusa e falou “OSSO CRIPOTIKIN” que eu entendi quando vi que
ela tava de colete. Então eu falei “ah foda-se. Quer fazer amor?”. Amor...
Quando foi que eu falei desse jeito! Ela concordou com a cabeça e eu puxei
minha pistola pra fora aí eu notei que minha pistola tava muito pequena.
Parecia a pistola de uma criança... E foi diminuindo, diminuindo. E ela tava lá
sentada em alguma coisa com as perna aberta na minha frente. E minha pistola
era do tamanho dum rigatone. Inútil. Olhei pra ela, sem jeito e ela me olhou.
Não era muito bonita, mas também não era nada feia. E eu lá... Sem pinto. De
qualquer forma agarrei ela pela cintura e pensei “vou fuder assim mesmo”, mas
quando me aproximei mais ela tinha virado... Olha só que merda. Ela tinha
virado uma garrafa de cocacola. E uma garrafa de coca vazia.
-tipo, quando eu parei de
escrever poemas, achei que ia arrumar um novo hobby.
-isso quer dizer o que? Que eu me
vejo como um idiota sem pinto?
-talvez o skate seja o caminho.
-que eu me acho incapaz de
satisfazer uma mulher?
-olha lá! O cara tá pegando uma
mina
-será que eles falavam russo
porque eu me julgo incapaz de me comunicar com os outros?
-eu comia aquela rabeta fácil
-e porque eu matei o cara que ela
tava pegando? Sou um ciumento doente?
-cara quantas coisas tem no mundo
além de um skatista suado...
-porra mano eu to muito
preocupado com tudo isso. Acho que é um sinal de alguma forma... Minha sanidade
me abandonando.
-por exemplo, os poetas!
Marvin
ficou pensativo enquanto o Luiz puxou um bloquinho do bolso e começou a
rabiscar nele com uma caneta de propaganda. O skatista ignorava a existência
daqueles dois seres bizarros. Tão diferentes um do outro e, até por isso, muito
parecidos também.
Luiz
olha para Marvin e começa a declamar:
Gata, Você já notou
Que toda vez que nós
Nos encontramos e estamos a sós
Você fica dançando e dando show?
Tudo isso é muito triste
Pois o escuro não te deixa ver
Meu membro em riste
-o que você achou?- Luiz
perguntou
-to achando isso tudo uma merda.
To muito confuso.
-também achei meio direto demais.
Falta metáfora.
-o que?
-meu poema
-ah tá... Bom, Luiz, já to indo
até depois.
Marvin
saiu andando em direção a sua casa e deixou o Luiz lá, procurando a
metáfora necessária, pra amolecer seu
membro em riste.
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