domingo, junho 22, 2014

                Marvin estava encostado na grade há um bom tempo. Várias pessoas também estavam encostadas a sua volta, mas ninguém prestava atenção nele. Todos estavam olhando para dentro da pista de skate onde um cara parecia saber voar. Ele subia e descia. Ia dando grind nas bordas da piscina vazia. Todas as meninas queriam dar pra ele e, alguns meninos também.
                Por várias vezes parecia que ele ia cair de costas no chão, mas era só mais uma manobra. De lá de longe veio chegando como quem não quer nada um cara alto que andava um pouco curvado por aí. Ele fumava um cigarro e chutava pedrinhas enquanto andava.
-oi Marvin- ele disse como se estivesse morrendo
-e aí Luiz. Faz muito tempo que não te vejo. Sei lá uns 6 meses
-pois é
-ainda tá escrevendo alguma coisa?
-parei.
-como assim Luiz?
-O que eu escrevia parou de fazer sentido pra mim
-é uma  pena, parar de fazer sentido é a pior coisa que já me aconteceu.
                Luiz ficou um tempo olhando o skatista e, então, ofereceu um cigarro para Marvin. Ficaram fumando em silêncio até que o skatista saiu de dentro da piscina vazia e colocou seu skate de lado.
-o que ele tem que nós não temos?
-habilidade...
-além disso?
-sei lá
                Um monte de gente estava em volta do skatista conversando com ele. Marvin e Luiz continuaram encostados na grade fumando um cigarro. Por fim, Marvin quebrou o silêncio.
-um monte de coisa parou de fazer sentido ultimamente.
-quando eu era mais novo eu andava de skate
-tipo, eu entendo que o sol nasce todo dia.
-mas eu era muito ruim
-mas não entendo por que o resto, tudo, acontece assim manja?
-foda... Mas eu tinha medo de quebrar o braço
-tipo quando você acorda com medo no meio da noite. Eu acordo tremendo e me cubro com o lençol até cair no sono.
-minha prima andava de skate melhor que eu
-aí quando eu acordo de manhã eu acabo me lembrando que acordei com medo ontem e penso “caralho Marvin, tu é muito escroto”
-se eu tivesse dinheiro ia aprender a andar de skate hoje em dia
-mas nada disso importa porque a noite eu acordo de novo morrendo de medo. E eu nem tava sonhando com nada. Só acordo com medo e tremendo que nem um cachorro de madame.
-foda... Mas custa caro demais
-tipo, ontem eu acordei com medo, mas voltei a dormir só pra ter um sonho bizarro em seguida.  Cara meu sonho foi mais ou menos assim. Era como se eu tivesse num videogame, um videogame muito ruim. Eu tinha uma arma, tipo um revólver preto, que eu mirava nas pessoas. Eu tava tentando levar outros dois caras, ou um cara e uma mina, não me lembro,  pra um ponto específico do prédio. E essas pessoas continuavam vindo atrás de mim pra me matar. Eu mirava elas com meu revólver preto e atirava. Atirava várias vezes. E elas nunca levavam tiro. Simplesmente desapareciam depois que dava 6 ou 7 tiros nelas. Minha vó, quando me ensinou a atirar, empunhava uma pistola azul de brinquedo que eu tinha. Ela falou algo como “se você pegar assim, com uma mão cobrindo a outra, e apontar acima do alvo e descer um pouco até ter na mira o que você quer acertar. Bum. Você nunca erra”. Eu fazia exatamente como minha vó mandou, mas mesmo, assim errava aquelas pessoas. Depois de um tempo eu encostei as pessoas que tava escoltando numa parede e os mandei ficar relaxando um pouco por que tava cansado. Nesse momento mais dois inimigos vieram, um cara e uma mina. Eles não me viram a principio então eu fiquei parado. Cada um tinha uma espingarda muito bizarra parecia de brinquedo. Aí o cara colocou a dele de lado e resolveu tirar a blusa. Ficar sem camisa no meio duma porra duma guerra. Aí a mina ficou se esfregando nele. Eu fui, rastejando, até a espingarda e peguei-a. Engatilhei e voltei rastejando até o cara. Mirei no cu dele. Sério, mirei bem no cu dele. E atirei. Por um momento achei que a arma não ia funcionar já que  ela parecia uma arma de brinquedo. Mas funcionou.  Saiu sangue por todo lado. E o cara caiu em cima de mim. A mina ficou gritando alguma coisa em russo ou ucraniano ou bósnio sei lá. Eu me levantei e coloquei a espingarda no peito dela e atirei. Bum.  Mas ela não caiu. Então ela tirou a blusa e falou “OSSO CRIPOTIKIN” que eu entendi quando vi que ela tava de colete. Então eu falei “ah foda-se. Quer fazer amor?”. Amor... Quando foi que eu falei desse jeito! Ela concordou com a cabeça e eu puxei minha pistola pra fora aí eu notei que minha pistola tava muito pequena. Parecia a pistola de uma criança... E foi diminuindo, diminuindo. E ela tava lá sentada em alguma coisa com as perna aberta na minha frente. E minha pistola era do tamanho dum rigatone. Inútil. Olhei pra ela, sem jeito e ela me olhou. Não era muito bonita, mas também não era nada feia. E eu lá... Sem pinto. De qualquer forma agarrei ela pela cintura e pensei “vou fuder assim mesmo”, mas quando me aproximei mais ela tinha virado... Olha só que merda. Ela tinha virado uma garrafa de cocacola. E uma garrafa de coca vazia.
-tipo, quando eu parei de escrever poemas, achei que ia arrumar um novo hobby.
-isso quer dizer o que? Que eu me vejo como um idiota sem pinto?
-talvez o skate seja o caminho.
-que eu me acho incapaz de satisfazer uma mulher?
-olha lá! O cara tá pegando uma mina
-será que eles falavam russo porque eu me julgo incapaz de me comunicar com os outros?
-eu comia aquela rabeta fácil
-e porque eu matei o cara que ela tava pegando? Sou um ciumento doente?
-cara quantas coisas tem no mundo além de um skatista suado...
-porra mano eu to muito preocupado com tudo isso. Acho que é um sinal de alguma forma... Minha sanidade me abandonando.
-por exemplo, os poetas!
                Marvin ficou pensativo enquanto o Luiz puxou um bloquinho do bolso e começou a rabiscar nele com uma caneta de propaganda. O skatista ignorava a existência daqueles dois seres bizarros. Tão diferentes um do outro e, até por isso, muito parecidos também.
                Luiz olha para Marvin e começa a declamar:

Gata, Você já notou
Que toda vez que nós
Nos encontramos e estamos a sós
Você fica dançando e dando show?

Tudo isso é muito triste
Pois o escuro não te deixa ver
Meu membro em riste

-o que você achou?- Luiz perguntou
-to achando isso tudo uma merda. To muito confuso.
-também achei meio direto demais. Falta metáfora.
-o que?
-meu poema
-ah tá... Bom, Luiz, já to indo até depois.


                Marvin saiu andando em direção a sua casa e deixou o Luiz lá, procurando a metáfora  necessária, pra amolecer seu membro em riste.

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